top of page

'É gente humilde'

SÃO GONÇALO DE AFETOS


Por Paulinho Freitas





Trabalho no bairro Amendoeiras, numa rua sem saída. Aqui, na frente da casa em que trabalho tem uma vizinhança muito bacana. São umas quatro ou cinco casas coladas, onde moram pessoas de uma mesma família, irmãos tios e sobrinhos. Todos os domingos eles repetem o mesmo ritual: Às oito da manhã, mais ou menos o som é ligado com músicas gospel. Enquanto os homens varrem a rua e improvisam um fogão a lenha na calçada, as mulheres cortam legumes, hortaliças e vários tipos de tempero. Lá pelas dez horas as crianças vão chegando com cara de sono, mas já ligadas no 220 volts, fazendo a maior farra. 


Não demora muito e as panelas entram no fogo com muita comida, o cheiro bom vai longe e alguns vizinhos já se juntam com eles. A essa altura alguém já trouxe dois litrões de cerveja bem gelados. Copos são cheios, um brinde e o primeiro copo é virado direto, com aquele haaaaaaa!!! No final.  


Na caixa de som já entra um Benito de Paula cantando “Meu Amigo Charles Brown”. As mães vão pondo o almoço das crianças e depois, um a um os adultos vão fazendo seus pratos. Alguns nem almoçam, ficam só no tira gosto. 


Causos são contados, gargalhadas correm a solto pela calçada e os litrões de cerveja não param de chegar. Lá pelas quatro ou cinco horas é servido o lanche para a criançada.  Quando escurece, Zeca Pagodinho canta “Lama nas Ruas” no último volume, Alcione canta “Meu Ébano” e a cereja do bolo é  Bebeto, o Rei dos bailes, chegando com “Eu encontrei a Carolina...” a galera já entra no ritmo da dança de salão e a rua se transforma num lindo salão de baile enquanto os adolescentes raspam o fundo das panelas. 


O céu parece estar em festa, as estrelas brilham cada vez mais forte e a lua parece cantar. Agora o funk embala a limpeza da rua, o guardar de mesas, cadeiras, o lavar das loucas, a garotada pensa tomar conta da festa, mas a velha guarda também vai até o chão quando a batida funk, que não deixa ninguém parado Acompanhada de um “Senta, senta, senta...” Entra em cena. As estrelas brincam em volta da lua, o sereno frio faz os cães e gatos esquecerem as rusgas e se abrigarem sob o mesmo carro e a noite silencia. 


Às cinco da manhã de segunda feira começa a procissão de pessoas indo para o trabalho conversando sobre o domingo, comentando coisas engraçadas que aconteceram no dia anterior, logo depois as crianças passam a caminho da escola e acenando para as senhoras, sentadas em cadeiras nos portões, pedindo suas bençãos. O sol segue iluminando e abençoando os caminhos da semana que se inicia. Entro no carro para o retorno a minha casa depois de vinte e quatro horas de trabalho, no rádio as notícias da manhã, na lembrança, o domingo daquela família maravilhosa. O sinal fecha, paro o carro, dou uma olhada nas pessoas indo e vindo. Obrigado meu Deus, por ter vivido tudo isso! 


“...Que vontade de chorar!” 


Domingo que vem, tem mais.  


Ah meu São Gonçalo! Protegei os filhos da tua terra! 


Nos siga no BlueSky AQUI.

Entre no nosso grupo de WhatsApp AQUI.

Entre no nosso grupo do Telegram AQUI.


Ajude a fortalecer nosso jornalismo independente contribuindo com a campanha 'Sou Daki e Apoio' de financiamento coletivo do Jornal Daki. Clique AQUI e contribua.


Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.


POLÍTICA

KOTIDIANO

CULTURA

TENDÊNCIAS
& DEBATES

telegram cor.png
bottom of page