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Águas de Outono - por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS


Foto: Pixabay
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Na década de oitenta, final de outono, na Rua Visconde de Itaúna, no bairro Paraíso, João Bahia chorava a perda de todos os móveis, utensílios, roupas e documentos. O rio transbordou com o temporal e invadiu várias casas, João e os vizinhos estavam desesperados e desamparados pelo poder público. Os vizinhos acolhiam, davam alimento e abrigo até que todos se reequilibrassem. Todos os anos era a mesma coisa e nada podiam fazer. Aquele ano foi pior, o primeiro e único filho de João Bahia acabara de nascer, sua esposa ainda no hospital, de nada sabia e nem imaginava que o enxoval feito com tanto carinho tinha ido rio abaixo.


Nada como o tempo e o sol da primavera para secar a rua e o pranto, baixar as águas do rio e renovar as esperanças.



E este menino arisco e levado chamado tempo, continuou passando, o filho de João Bahia cresceu e na semana passada nasceu seu primeiro filho e como no dia de seu nascimento , quarenta anos atrás, a chuva castigou São Gonçalo e fez do bairro uma réplica do dilúvio, muita água lavando as ruas. João Boca, filho de João Bahia parecia uma foto de seu pai no dia de sua chegada ao mundo. Sentado numa calçada alta no início da rua olhava para o nada, perdeu tudo, móveis, utensílios, roupas e documentos. Apesar de ter levantado a casa, feito barragem, nada adiantou, a força da água não tem limite.


O sol voltou para secar a rua e as lágrimas, encher de luz e esperança os olhos daqueles que já a perderam de vista. Uma grande lua ilumina São Gonçalo. Enquanto João Boca tenta reconstruir a vida e os sonhos, lá em Alcântara, numa grande festa, mais de 20 mil pessoas celebram os 133 anos de emancipação da Cidade a um custo tão grande que daria para amenizar o sofrimento de João Boca e tantos outros irmãos que desde que São Gonçalo é São Gonçalo, governo atrás de governo, sofrem do mesmo mal: O abandono.


Ah meu São Gonçalo! Protejei os filhos de sua terra! Amém!


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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.



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