Romario Regis: 'O governo poderia mandar a LDO num papel de pão'
Vereador, que protagonizou sessão histórica na Câmara nesta semana, disse em entrevista que governo Nelson Ruas está parado no tempo, em pautas dos anos 80
Por Helcio Albano
Os vereadores de oposição ao governo Nelson Ruas (PL), Prof. Josemar (Psol), Priscilla Canedo (PT) e Romario Regis (PCdoB) viraram notícia nesta semana ao romperem uma antiga tradição na Câmara, que é manter, em votação em bloco e sem maiores discussões, os vetos do Executivo às proposições parlamentares individuais à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
A LDO, em linhas gerais, estabelece quais serão as metas e prioridades de um governo para o ano seguinte. Ela fixa o montante de recursos que o governo pretende economizar; traça regras, vedações e limites para as despesas dos Poderes. No caso municipal, o Executivo e o Legislativo.
Depois de aprovada, a LDO irá servir de base para a Lei Orçamentária Anual (LOA), que rege a aplicação de cada centavo do orçamento municipal. Isso vale desde o asfalto que tapa o buraco de sua rua até a massa que eventualmente venha tapar o buraco do seu dente.
O "trio parada dura" não teve medo de cara feia, e com o artigo 218 do regimento interno da Câmara debaixo do braço, pediu para que as suas 151 proposições vetadas pelo prefeito fossem discutidas, uma a uma, no Plenário. Discussões, estas, que poderiam levar até 75 horas se cada vereador seguisse à risca suas prerrogativas e usasse os 30 minutos que tem direito em apreciar cada veto.
A já histórica sessão de 11 de agosto de 2021 não durou as 75 horas caso fossem colocadas em discussão os 151 vetos, mas 7 horas e 40 minutos, tempo que levou a discussão dos 51 vetos dados às propostas de emenda do vereador Romario Regis.
O relógio do painel eletrônico da Câmara marcava 00h40min do dia 12 de agosto quando o presidente da casa legislativa, Lecinho Bredas (MDB), após acordo com a oposição em nome da boa convivência entre os pares, declarou encerrada a sessão, que teve início às 17h do dia anterior. Fato inédito na história do parlamento municipal, pelo menos nos últimos 50 anos.
O vereador Romario Regis, 31 anos, conversou com o Daki sobre a sessão do dia 11 de agosto, onde aponta o pouco caso do governo com as discussões em torno da LDO neste ano, um "copia e cola do Nanci", que ele diz que poderia ser enviada à Câmara em "papel de pão", o apego desse mesmo governo a pautas dos anos 1980 e a sua incapacidade de entender e lidar com novos modelos de oposição na cidade.
A LDO é a lei anual mais importante da cidade. Mas, paradoxalmente, tem pouca participação da sociedade. O que explica o pouco caso dos governos e o assombro quando tratada com a importância que merece.
Segue a entrevista:
O que motivou o posicionamento da oposição e o seu em particular na sessão de quarta, 11 de agosto, quando se discutiu os vetos do Executivo à LDO?
O nosso posicionamento na Sessão de quarta tem relação com a função do debate sobre da LDO. A gente fez três audiências, o governo mandou vários secretários para poder responder aos questionamentos e quando a gente vai fazer as propostas, baseadas inclusive nas falas dos secretários, absolutamente nada é acolhido. Ou seja o governo poderia mandar a LDO num papel de pão, porque basicamente estava a fim só de chancelar uma proposta deles e não fazer nenhuma mudança importante.
A LDO apresentada pelo governo, então, é um faz de conta?
Esse documento da LDO é um documento que vai dizer quais projetos a cidade vai organizar para os próximos meses e para o próximo ano. E se esse documento é o "copia e cola" do Nanci da última gestão, basicamente governo Nelson tá continuando o trabalho que o Nanci fez de não mudar absolutamente nada em relação às defesas que ele poderia ter feito.
O que foi apresentado de fato, então na LDO?
São nesses debates sobre a LDO, sobre LOA, sobre Plano Plurianual que a gente vê se de fato a Prefeitura está priorizando alguns temas. E basicamente, mesmo as propostas de campanha do atual prefeito não foram contempladas nesse plano. Ou seja, nem as defesas que ele fez me parecem fazer sentido para ele defender agora. O que faz com que São Gonçalo pareça ainda estar na década de 80 em que só asfalto, poda de árvore limpar meio-fio faz sentido para esse governo.
A decisão em usar à risca o regimento gerou mal-estar entre os colegas?
A Sessão acabou no horário até avançado, mas a gente podia ter ido mais. Se a gente quisesse ficar lá 48 horas, a gente com certeza conseguiria. Basicamente a gente ficaria 10 minutos em cada pauta, eu e o Josemar. Aí seriam 20 minutos por proposição. A gente fez 151 (proposições), se for contar de nós três. E isso poderia fazer a gente ficar lá 48 horas. Sendo que a gente optou como gesto para não atrapalhar os vereadores, de sair antes. Lembrando que ser oposição ao governo, não quer dizer que a gente seja oposição aos vereadores. Então, preservar a relação com os vereadores foi o motivo que fez a gente retirar de pauta as discussões e ser votado em bloco aquelas propostas. Mas se a gente tivesse que colocar os secretários para ficar em 48 horas, aí sim a gente ficaria até o final.
O que fica de tudo isso?
A cidade precisa saber lidar com novos modelos de oposição. Nem eu, nem Josemar nem a Priscila vamos para o Plenário para ficar gritando, falando mal pessoalmente de ninguém, mas a gente tem alguns instrumentos técnicos a nosso favor. Que é ter uma equipe qualificada, ter uma noção sobre Regimento. Ter uma noção do que a política pode entregar no ponto de vista de enfrentamento. Então, sem ofender ninguém, sem gerar nenhum constrangimento, sem fazer nenhum denuncismo, a gente conseguiu a partir da discussão da LDO, tratar a gestão como ela está tratando a cidade, que é ignorando os canais discutem institucionais.
Helcio Albano é jornalista e editor-chefe do Jornal Daki.