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Foto do escritorJornal Daki

Perdão, povo Yanomami - por Mário Lima Jr.


Foto: Reprodução
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Há momentos de desespero extremo em que nada importa nem pode amenizar a dor, muito menos um simples pedido de perdão, como agora. Mas quando não há possibilidade nenhuma de ser ouvido, porque as vítimas estão cobertas de sofrimento, ele se faz mais urgente e necessário ao pecador. Perdão, povo Yanomami!


Dragar duas crianças da comunidade Macuxi Yano brincando na margem do Rio Parima, cuspi-las para o meio do rio e deixar que fossem levadas pela correnteza indica que a crueldade que cometemos há séculos, sabidamente sem limites, renova suas tecnologias e ferramentas. Tinham apenas 5 e 7 anos de idade. E antes de serem sugadas pela draga do garimpo ilegal no dia 12 de outubro, tiveram malária, doença que também usamos como maneira de extermínio.



Pelo ouro e pelo dinheiro, tradicionalmente contaminamos rios e pessoas com mercúrio, derrubamos a floresta, matamos os animais e destruímos o sustento do povo. Armas de fogo e facões são amplamente utilizados contra os corpos indígenas. Só que nenhum dos mais de quatro milhões de indivíduos exterminados desde o início da invasão do Brasil, como Darcy Ribeiro estimou em “O povo brasileiro”, havia sido morto por uma draga. Coube às crianças do povo Yanomami servir de cobaia desta nova forma de execução.


É impossível que criminosos tão sádicos, que sentem tanto prazer no mal, sejam desobrigados da culpa. O sofrimento que causamos são absolutamente propositais. Pedir perdão pode ser visto como uma audácia, até mesmo ofensa, pela cultura dos brancos. Que é a cultura da violência extrema. Para um povo que enxerga a natureza como “uma entidade viva, inserida numa complexa dinâmica cosmológica de intercâmbios entre humanos e não-humanos” (ISA), espero que possa existir uma interpretação diferente para o pedido de perdão não merecido. A própria indiferença seria compreensível e suficiente.



Muitos de nós gostariam de viver em um país em que não colaboram com o preconceito racial, com a opressão e assassinato dos povos originários. No entanto, todos os dias trocamos a esperança pela covardia. Nossa falta de caráter permite que a exploração ilegal e prejudicial das milenares terras indígenas assuma os postos mais altos do poder político pregando a mentira de que há apenas um Brasil. Na verdade, só no Brasil indígena temos 305 etnias falando ao menos 274 línguas (BBC Brasil). Majoritária no país é a sede de sangue, que só poderá ser combatida se aprendermos noções de dignidade e amor com os antepassados que já ocupavam esta terra antes da chegada de outros povos.

Mário Lima Jr. é escritor.




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