O Sol é para todos
Por Edir Tereza dos Reis
Hoje, para os eleitores Daki, adentraremos no estilo crônica com muita humildade e imensas saudades do mestre Rubem Alves, que a qualquer fato cotidiano imbuía toda beleza de sua alma, expressa em crônicas que nos emocionavam.
Nosso pano de fundo é a educação - a que temos e a que queremos; aquela que se pensa autônoma e aquela que clama pelas redes de referência e por um sistema socioeconômico equânime para que nossas crianças possam se desenvolver em plenitude.
Comemorava o aniversário numa praia domingo e comprei de um, dentre as dezenas de ambulantes, do criativo artesanato popular, um brinco. Retornei terça-feira a mesma praia e após alguns minutos estirada na areia, me assusto com dois moleques me olhando e as bijuterias expostas, um deles com o braço esticado e mãos cerradas. Compreendi que era o “famoso “soquinho de cumprimento que os cariocas usam. Iniciou-se o seguinte diálogo:
- Quer um brinco, um anel?
- Não, domingo comprei o brinco que estou usando.
- Ah, foi do meu tio... falou orgulhoso. Vendemos aqui na praia.
- E a escola, perguntei severamente.
- Nós vamos! Estamos de férias... me olhou, sorriu, deu mais um soquinho de mão, como se me conhecesse por toda vida e se foi.
Fiquei chocada porque férias é para todos descansarem, férias de crianças é para brincar!
Sua última frase ficou tatuada em meu cérebro e neste artigo a exponho num coro com as milhares de vozes dos militantes em direitos humanos e pela efetivação da Lei 8.069/90 ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.
Apesar dos quase 33 anos de ECA o trabalho infantil ainda é banalizado no Brasil. Nós cidadãos enfrentamos o dilema, diante de situações como esta, de adquirir o produto que a criança vende porque sabemos que de uma forma ou de outra é para sua sobrevivência, ou não comprar para não incentivar, seguindo o direcionamento das redes de proteção infantil, que infelizmente, não garantem políticas públicas de proteção às crianças.
É cruel para nós cidadãos, é desumano para com as crianças, é dever das autoridades brasileiras, com seus altíssimos salários e bonificações, efetivarem todas as leis de proteção social e evitarem esse crime a olhos vistos no solo brasileiro – O trabalho infantil.
Concluo esta crônica expulsando de meu cérebro a projeção de que, em mais um dia de sol, milhares de crianças estarão de férias pelo litoral brasileiro com os pés na areia quente, fingindo ser gente grande para conquistar fregueses e garantir a sobrevivência.
Colaboração: Graciane Volotão e Hélida Gmeiner
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Edir Tereza dos Reis é Orientadora Pedagógica (PMDC), Supervisora Educacional (PMSG), Psicopedagoga, especialista em Neurociências, membra do Coletivo ELA – Educação Liberdade para Aprender e colaboradora da Coluna "Daki da Educação", publicada às sextas.