Nanci desistiu de São Gonçalo e foi fazer compras, por Mário Lima Jr.
José Luiz Nanci tem o direito de aproveitar seu fim de semana da forma como preferir. Abrindo os botões da camisa até o umbigo e tomando uma cerveja gelada na Praia das Pedrinhas, em um sábado à tarde, sentindo a brisa do mar batendo levemente na barriga. Comprando legumes com a esposa num mercadinho enquanto responde pelo WhatsApp, quase quebrando a tela do celular, às mensagens dos vereadores famintos por cargos no governo. O que o prefeito de São Gonçalo não pode fazer é se ausentar do debate em torno da construção de uma cidade melhor. Não liderar nem propor qualquer iniciativa de transformação social no último ano do seu governo, provando que, desde o princípio, desperdiçou o voto do gonçalense. Ainda por cima, mais omisso do que nunca e distante do sonho de um município sem tanta pobreza nas ruas, parar para fazer compras com toda calma do mundo, como se nada estivesse acontecendo.
Aí, Nanci, você envergonha São Gonçalo. A pobreza e a violência estão crescendo, sem falar na falta de mobilidade urbana e na sujeira do município. As marchinhas de Carnaval que fizeram em sua homenagem, acusando você de não participar ativamente do governo, se mostram verdadeiras. Tanto que a oposição o ignora completamente. Os pré-candidatos à Prefeitura não citam o prefeito atual porque ninguém em sã consciência bate em cachorro morto, embora Nanci tenha dado entrevista aos jornais da cidade alegando querer a reeleição.
Nanci já desistiu de São Gonçalo faz tempo e entregou o controle da sua vida política ao administrador da sua conta oficial no Facebook, que há anos publica fotos do prefeito em poses constrangedoras. Por exemplo, sorrindo sem graça e se apoiando de lado em uma placa com a foto de um metrô, metrô que os mais de 1 milhão de habitantes de São Gonçalo tanto precisam.
A única coisa clara nesse governo iniciado em 2017 foi o favorecimento da família do prefeito com altos salários e cargos em posições estratégicas. Da Comissão Especial de Desenvolvimento, Relações Institucionais, Prospecção e Controle de Receita e Despesa, controlada pela primeira-dama, à Secretaria de Planejamento e Projetos Especiais, comandada pelo genro do prefeito. Não pense que são os únicos parentes empregados. Foram acolhidos com o dinheiro público sobrinhos, primos e seus cônjuges, tanto de Nanci quanto da primeira-dama.
O escândalo do nepotismo promovido às claras por Nanci seria motivo suficiente para derrubar o governo inteiro. Ainda assim, todos, ó Deus, inclusive a mãe do genro de Nanci, ganhando R$ 12 mil por mês no controle da Fundação de Assistência à Saúde dos Servidores de São Gonçalo, desperdiçaram a chance de contribuir minimamente pelo bem do município. Sugaram e sugaram tudo o que podiam sem parar e o que vemos em São Gonçalo novamente é escuridão. A mesma do final do governo Mulim.
Não adianta dizer que os problemas da cidade são grandes demais. Cada político assume o cargo para o qual foi eleito conhecendo os desafios que vai enfrentar. Se não conhece, não merece o cargo. Se não montou estratégias para superar os problemas, também não merece. Nanci não fracassou e desistiu por causa dos problemas de São Gonçalo. Além das suas limitações pessoas, de propósito o prefeito ignora técnicas, tecnologias e soluções da atualidade que ajudam a combater problemas administrativos e de gestão.
A crise em São Gonçalo é tão profunda que até Eduardo Gordo desistiu da política. Saiu em todos os jornais. Cansou de ver tanta safadeza e acusações injustas contra ele. Força, Eduardo. O vice-prefeito desistiu, ou nunca tentou, ocupar um espaço vazio dentro do pensamento a respeito dos rumos que São Gonçalo pode adotar enquanto território. O camelô também desistiu, menos da própria sobrevivência, ao jogar dentro do rio Alcântara as caixas de papelão dos iogurtes roubados que vende. O gonçalense comum desistiu e usa o Facebook para desabafar sua ausência em torno de um engajamento social positivo.
Já Nanci abriu mão do governo para o qual se elegeu. Temos pela frente mais 10 meses com um prefeito tão útil quanto um daqueles bonecos que desfilaram no Carnaval de Olinda. E não podemos culpar o eleitor e aguardar as próximas eleições. O povo que mora nas localidades sem saneamento básico, asfalto e iluminação pública não merece tanto sofrimento.
Mário Lima Jr. é escritor.