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Foto do escritorJornal Daki

Loucura e liberdade, por Cristiana Souza


Arthur Bispo do Rosario, o "artista louco", e o seu manto da apresentação/Divulgação
Arthur Bispo do Rosario, o "artista louco", e o seu manto da apresentação/Divulgação

Durante três semestres estagiei em um hospital geral, no setor da psiquiatria, onde pessoas que por algum motivo relacionado a transtornos mentais são levadas para esse espaço. O que mais me marcou desde o primeiro dia que estive nesse lugar foi a forma que me olharam: um olhar perdido e triste.


Antes dessa experiência pouco havia pensado sobre a loucura, mas a partir desse contato, fui tomada por vários questionamentos, afinal o que é ser normal?

Sou reconhecida em meu convívio como uma pessoa normal por ter um comportamento socialmente aceitável. Todavia, a complexidade da loucura e dos transtornos mentais, está infinitamente distante de um comportamento inadequado aos padrões de uma sociedade “sã”.


A história nos conta o quanto de injustiças e barbaridades foram cometidas nos manicômios, sanatórios e hospitais psiquiátricos por um longo período. Muitas pessoas internadas nesses lugares eram levadas contra sua vontade por familiares que não lhe davam o direito de escolha, e a partir daí eram privadas do seu convívio social, sofrendo tortura física, psicológica, e em muitos casos definhavam até a morte.


Nesse contexto, um dos lugares mais aterrorizantes conhecidos no Brasil é o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena, hospício onde ao menos 60 mil brasileiros morreram – ou foram mortos, em muitos casos.



Fundado em 1903, o hospício conhecido como Colônia se transformou, ao longo das décadas seguintes, mas principalmente entre as décadas de 1960 e 1980, em um depósito de pessoas indesejadas, muitas delas sem qualquer diagnóstico de problemas mentais. Eram submetidas a condições sub-humanas capazes de revirar o estômago de qualquer pessoa que não seja completamente indiferente ao sofrimento alheio. (Sobre o tema, indico a leitura do livro Holocausto Brasileiro, editora Geração, 2013)


Após um longo período de horror e com o objetivo de transformar e humanizar o cuidado das pessoas com sofrimentos psíquicos, no ano de 2001, foi aprovada a Reforma Psiquiátrica e assim nas últimas décadas foram sendo desativados os leitos psiquiátricos.

Hoje, apesar das ações deliberadas de uma política de governo cruel e desumana, ainda temos os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), organizados em seis modalidades, que atendem pessoas com sofrimento mental. Encontramos nesses equipamentos, uma equipe multidisciplinar que atua na perspectiva da melhora do paciente, no fortalecimento do vínculo familiar e social. Os pacientes fazem várias atividades e terapias ocupacionais.


A internação compulsória; aquela que acontece sem o consentimento do paciente, é desumano e fere o direito de ir e vir, mesmo que a pessoa tenha alguma questão relacionada à saúde mental ou dependência química.


Acredito que uma pessoa com transtorno mental sendo tratada com dignidade e livre, possui uma grande chance de ter uma vida saudável, de sonhar, realizar e de ser feliz.


***

Nota do editor: conheça um pouco da história de Arthur Bispo do Rosário aqui.

Cristiana Souza é Assistente Social.


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