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Irmãos do Mundo

Por Paulinho Freitas


SÃO GONÇALO DE AFETOS


Foto: Pixabay
Foto: Pixabay

Ela queria viajar o mundo, conhecer lugares e pessoas. Ter nos pés asas, corpo de barco, braços de remo de canoa. Ela viajava por lugares inexistentes aos olhares humanos, olhava as terras onde ninguém jamais pisou. Onde tudo era do jeito dela, com a beleza dos olhos dela que ninguém nunca enxergou. E ficava assim na sua varanda olhando o azul da serra de Petrópolis longínquo, a torre da Ilha do Pontal, o mar da Praia da Tamarineira, o cheiro da maré da tarde que invadia um Gradim ainda exuberante, cheio de fábricas de pescados em lata, matadouro de bois com os magarefes sedentos pelo sangue bebidos em canecas, ainda quentes.


Passou sua vida imaginando um forasteiro descendo dos céus, num cavalo alado, suado, com a poeira da estrada celeste colada em seu rosto. A pele queimadas pelo sol, os lábios sedentos por um gole d’água e um beijo seu.


Do outro lado da rua ele a olhava como os olhos de uma águia na campana de uma lebre, do alto da montanha, pronta para alçar voo e pegá-la sem chance de defesa, num zás trás, levá-la para as alturas e devorá-la antes mesmo de pousar de volta ao solo. Os dias passando como acordes construídos por uma melodia de amor, uma corda de vez, cada dedo em seu lugar, tudo perfeito, para ouvir, fechar os olhos e se deixar levar. Ela é som que os olhos escutam, é a beleza que os ouvidos veem.



Tanto Maria, quanto João se imaginavam nobres. Mesmo estando um numa varanda em frente da outra não se davam confiança e se imaginavam, ela, princesa, ter aquele forasteiro fedorento e forte como um Hércules sul-americano, para amar, respeitar e lavar-lhe os pés no final de mais um dia na peleja pela vida, e, ele, príncipe em busca de uma humilde camponesa, de pés descalços e coração livre, que a pudesse amar, respeitar, ser totalmente diferente do que seu pai fora para sua mãe.


Numa noite de temporal a rainha Maria ouviu um trotar sob sua janela, o vento assobiava e não deixava que nenhuma vela permanecesse acesa, mesmo assim ela conseguiu enxergar seu cavaleiro, molhado de chuva, barba por fazer e com o cheiro do forasteiro que sonhou a vida inteira, que a viria buscar para coloca-la em sua garupa e sair por esse mundo afora conhecendo terras distantes, dormindo e amando por esses caminhos de nosso Deus Pai.


Naquela mesma noite o Rei João vinha pela estrada escura, em comitiva depois de uma bem sucedida caçada e viu aquela bela camponesa descalça e perdida naquela tempestade. A pegou pela cintura e a colocando em sua garupa dispensou os soldados e galopou rumo ao infinito, deixando um rastro de estrelas e luz.


Na manhã seguinte, Maria e João, cada um em sua cama, foram encontrados sem vida, no hospital N. Sra. das Vitórias.


Só têm saúde mental quem sonha. Os “normais” recebem em sonhos, visitas indesejadas de fantasmas e monstros, acontecimentos trágicos, infortúnios, contas, traições, vaidades, mentiras e tentações.


Quem tem saúde mental quer se alimentar, amar, dormir e sonhar. Rir da vida e sorrir para ela. Fazer os “normais” enxergarem o coração sem abrir o peito, abraçar a alma sem tocar no corpo e serem felizes como uma flor da beira de estrada, que se abre em cores, simplesmente por receber alguns pingos de chuva, sem se importar se quem passa a notou ou não.


Os filhos do mundo precisam do mundo. Sejamos todos mundo. Cuidemos dos nossos filhos.


Ê mundo cão!


Até.


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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.




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