Domingos Brazão tem 87 imóveis em área de milícia que valeriam R$ 25 milhões, diz PF
Policias apontam a defesa do patrimônio da família na região como o principal motivador para o assassinato da vereadora Marielle Franco
O conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro) Domingos Brazão, acusado de ser o mandante da morte da vereadora Marielle Franco (PSOL), é dono de 87 imóveis, a maioria na zona oeste da capital fluminense, aponta relatório da Polícia Federal. Juntos, eles são avaliados em R$ 25 milhões, segundo a investigação.
Os agentes apontam a defesa do patrimônio da família na região, sob influência de milícias, como o principal motivador para o assassinato da vereadora.
Brazão e o irmão, o deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido), foram denunciados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) sob acusação de encomendar a morte de Marielle.
Segundo a acusação, os irmãos Brazão decidiram matar a vereadora para impedir que ela continuasse a prejudicar os interesses da família em práticas de grilagem de terras e para dissuadir outros integrantes do PSOL a adotar a mesma postura.
A defesa de Domingos Brazão afirmou, no momento da prisão, que ele não tem qualquer ligação com o caso da morte da vereadora e que “delações não devem ser tratadas como verdade absoluta”.
Chiquinho Brazão afirmou, em 26 de março, que tinha “ótima relação” com Marielle quando era vereador e minimizou a divergência apontada pela PF em relação a um projeto dele para flexibilizar regras de regularização de terras no Rio de Janeiro.
A PF afirma ter localizado na casa de Domingos Brazão dezenas de documentos sobre imóveis da empresa Superplan Administração de Bens Imóveis e Participações, de propriedade do conselheiro e sua mulher, Alice Brazão.
Pesquisa feita em cartórios pela PF identificou 87 imóveis, dos quais apenas 5 não estão na zona oeste. As aquisições, de acordo com os registros, somam R$ 25 milhões, em valores não atualizados. O relatório afirma que os números do levantamento “superaram as expectativas”.
“Fato que expõe de forma explícita que os interesses da família Brazão na região são da ordem das dezenas de milhões de reais. Revelando que a intrínseca relação desta com as milícias da região não se resume apenas a aspectos políticos como a formação e manutenção e manutenção de currais eleitorais, mas sim a um expressivo interesse patrimonial”, diz PF.
Os documentos também apontam, segundo a PF, indícios de grilagem de terras.
Um dos terrenos em nome da Superplan em Jacarepaguá teve sua matrícula aberta em 2021, após ação de usucapião de um casal formado por um eletricista e uma doméstica. Em agosto de 2023, a empresa de Brazão comprou metade da área, de 10 mil m², por R$ 110 mil.
A PF aponta suspeitas em relação à transação porque a prefeitura cobrou o ITBI avaliando o imóvel em R$ 7 milhões. A divergência levanta suspeitas de lavagem de dinheiro.
Outra transação chamou ainda mais a atenção dos investigadores. Trata-se de um terreno de 2.000 m² adquirido de um eletricista e sua mulher em 14 de maio de 2018, mas que só foi registrado em agosto de 2020.
A transação foi realizada dois meses depois da morte de Marielle e no mesmo dia em que foi publicada a lei apontada como ápice da divergência entre os Brazão e a vereadora.
“Os efeitos produzidos pela lei complemente 188/2018 poderiam acarretar incalculável valorização da extensão de terra adquirida pela Superplan, se não fosse a superveniente declaração de inconstitucionalidade do diploma legal meses depois”, afirma a PF.
A PF afirmou no relatório final do caso enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) que as divergências de Marielle na Câmara Municipal ao projeto de lei complementar 174/2016, de autoria do então vereador Chiquinho Brazão, “encontram-se no cerne da motivação do crime”.
O projeto de lei na mira da PF previa a regularização de terrenos e construções ilegais nas zonas oeste e norte da cidade. Segundo o relatório, ele favorecia a base eleitoral da família Brazão, bem como estimulava a grilagem de terras, na qual o grupo político atuava, de acordo com a polícia.
O projeto foi pela primeira vez ao plenário em maio de 2017. Na ocasião, foi aprovado com folga, com 34 votos.
Ele retornou à pauta em novembro de 2017 para correção de alguns erros em seu texto. Nesse dia, foi aprovado com 27 votos, apenas um mais do que o necessário. Votaram contra todos os vereadores do PSOL (cinco), Fernando Willian (PDT) e Leandro Lyra (Novo). Apenas Willian discursou para justificar o voto.
Crivella vetou o projeto, mas a Câmara derrubou a decisão em maio de 2018, dois meses após a morte de Marielle. Os vereadores do PSOL mantiveram o posicionamento, mas o veto foi rejeitado com os votos de 31 membros da Casa.
Segundo a PF, Lessa relatou ter ouvido de Domingos queixas sobre a atuação de Marielle em áreas de interesse da família. A polícia, contudo, relata que o ex-PM afirma existir a possibilidade de que um informante do grupo político tenha “superdimensionado” a atuação da vereadora.
A PF não aponta o projeto de lei como motivo, mas afirma que ele confere verossimilhança ao relato de Ronnie Lessa sobre o que foi a origem da ordem do crime.
“Não obstante a escassez de provas diretas decorrentes da natureza clandestina das tratativas que Ronnie Lessa alega ter mantido com Domingos e Chiquinho Brazão, é possível inferir que suas declarações sobre o motivo que teria ensejado a morte da vereadora Marielle Franco se mostram verossímeis diante dos dados e indícios ora apresentados”, diz a PF.
“Aqui impende destacar que esse cenário recrudesceu justamente no segundo semestre de 2017, atribuído pelo colaborador como sendo a origem do planejamento da execução ora investigada, ocasião na qual ressaltamos a descontrolada reação de Chiquinho Brazão à atuação de Marielle na apertada votação do PLC n.º 174/2016.”
Um ex-assessor da vereadora afirmou à PF que, dias após a segunda votação, Chiquinho teria recusado apoiar um projeto de lei de Marielle, praxe entre os vereadores. De acordo com o relato, o então vereador “teria reclamado da votação contrária de Marielle, demonstrando irritação fora do comum e jamais vista”.
Outra ex-assessora de Marielle, porém, afirmou à PF que a vereadora evitou durante seu mandato atuar na questão fundiária por considerá-la “um verdadeiro vespeiro” em razão do envolvimento de milicianos.
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