Ataques ao Bistrô atingem São Gonçalo inteira - por Mário Lima Jr.

Quando a cliente chega ao Bistrô D’Avó, ela é recebida na porta do restaurante pelo sorriso de um funcionário. Nada invasivo nem escandaloso, a gentileza respeita o jeito gonçalense de ser: meio reservado e inocente ao ponto de constranger o carioca, que não conta mais com o direito à pureza de coração. Mas sorrisos não puderam proteger o Bistrô. Em apenas duas semanas, o restaurante foi invadido e furtado três vezes. Junto com ele, o jeito gonçalense de ser e sorrir foi violentado.
O prejuízo material supera R$ 10 mil. A dor do Bistrô pela perda de itens de extremo valor sentimental não pode ser medida, mas pode ser sentida na reportagem que o jornal O São Gonçalo fez sobre a onda de furtos na rua Eduardo Vieira de Souza, no Rodo. Apesar do sofrimento, o restaurante continua de portas abertas, recebendo clientes com cultura e amor.
O Bistrô D’Avó não é apenas um empreendimento privado lutando para sobreviver numa crise econômica que se arrasta por anos. Alguns dos principais agentes políticos, culturais e sociais da cidade de São Gonçalo usam o Bistrô como ponto de encontro para se divertir e para reflexão, organização, lançamento e gestão dos seus projetos. Cada um deles é invadido e furtado também ao voltar ao restaurante e ver as paredes tocadas pelos bandidos, ou ao perceber o espaço vazio onde antes havia a cor dos eletrodomésticos levados.
Para a sociedade gonçalense que o Bistrô existe. Para a gastronomia, empreendedorismo, teatro, música e diversas atividades praticadas no local, como saraus e desfiles de moda para idosos. Pessoas que geralmente não encontram oportunidade para usar outro espaço além do Bistrô são bem-vindas, desde mulheres negras construindo o próprio sustento a escritores em início de carreira.
Não seria exagero a presença de policiais na rua Eduardo Vieira de Souza, 24 horas por dia. No mínimo, o Poder Público Municipal deveria ter tanto cuidado pelo Bistrô D’Avó quanto pela Prefeitura e pela Câmara. Talvez até mais cuidado, visto que há poucos anos deixaram a Prefeitura de São Gonçalo arder em chamas. As sucessivas invasões significam a exclusão completa da região onde o Bistrô está localizado do plano de segurança pública e desenvolvimento social da cidade. O drama encontrado ali não se resume a furtos. Seres humanos vivem no chão em situação de total falta de esperança. Sem espaços como o Bistrô D’Avó, restaria para São Gonçalo apenas a decadência como opção.
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Mário Lima Jr. é escritor.
