Adelino, Avelino, Odilon e Aristeu
SÃO GONÇALO DE AFETOS
Por Paulinho Freitas
Estava eu sentado na varanda olhando as árvores balançando ao vento. Entre um balançar e outro, uma réstia de sol ofuscava minha visão. Nesse abrir e fechar de olhos, quase cochilando, fiquei relendo minhas lembranças, histórias que vi passar diante de meus olhos.
Numa dessas, num certo carnaval, vi Odiléia aos beijos com Adelino. Namoraram, noivaram e casaram em menos de um ano e tudo era só amor. Os dois eram a imagem da felicidade. Não tinham pudor algum em ficar na varanda de casa namorando num fogo que fazia as vizinhas suspirarem de inveja e vontade de fazer igual.
O tempo foi passando e Adelino foi esfriando, já não era o mesmo. Quando questionado por Odiléia dizia que era normal as coisas ficarem mais calmas entre casais conforme o tempo fosse passando, mas que o amor era o mesmo, talvez até maior. Odiléia não queria saber de nada, achava que o marido a estava traindo e o jurava de morte. Tantas foram as brigas por ciúme que a separação aconteceu. Adelino sofreu muito, chegou a ficar doente, mas o tempo se encarregou de confortar o coração do pobre.
Não passou muito tempo e a fogosa Odiléia já estava aos amassos com Avelino e rapidamente juntaram os trapinhos jurando amor eterno. Novos namoros incandescentes na varanda, novos suspiros das vizinhas e vida que segue. Mas como diz um velho ditado, nada é para sempre.
Numa festa junina regada a muito quentão, danças, fogueira e balões deu-se o encontro de Odiléia e Avelino com Adelino. Todos ficaram apreensivos, já imaginando que os dois se engalfinhariam numa luta de morte por Odileia. Mas para o espanto de todos, os dois se abraçaram em prantos. Eram amigos de infância que há muito não se viam. Ficaram quase a festa toda conversando, relembrando os velhos tempos e desse dia em diante, todos os sábados saiam para pescar pela manhã e só voltavam tarde da noite.
A amizade era tão forte que um já dormia na casa do outro e faziam peixadas homéricas que duravam o domingo inteiro. Não demorou muito e o casamento de Odiléia e Avelino também subiu no telhado e rolou de lá para o chão numa velocidade sem precedentes. Enquanto Odiléia passava as tardes de sábado na varanda ouvindo o LP inteiro de Jamelão, bebendo Campari com tônica, chorando e jurando nunca mais se apaixonar, Adelino e Avelino curtiam as pescarias e peixadas nos finais de semana sem nem lembrar que Odiléia existia.
Foi numa festa de São José, numa brincadeira de morder a maçã, que Odilon fez Odiléia quebrar a promessa de nunca mais se apaixonar. Daquele dia para frente começou tudo de novo. Os amassos na varanda, os suspiros das vizinhas e a vida correndo feliz. Até que um dia os vizinhos organizaram uma grande festa junina e entre doses de quentão, quadrilhas e balão, eis que Odiléia encontra Adelino e Avelino. Ela com aquele olhar vencedor olhando os dois de cima abaixo, apresenta Odilon, o novo e eterno amor de sua vida. Adelino e Avelino olham sério para Odilon que encara os dois como cowboys duelando num filme de faroeste e quando tudo parecia que acabaria numa tragédia, os três caíram num grande abraço e pulavam sem parar comemorando o reencontro depois de anos sem se verem.
O casamento acabou ali mesmo. Os anos passaram. Os três amigos continuvam com suas pescarias nos finais de semana, Odiléia curtia Jamelão tomando seu Campari com tônica quando um caminhão de mudanças para no portão casa em frente. Para lá muda-se Aristeu que não escondeu que seu coração bateu mais forte quando viu os grandes olhos negros de Odiléia. O namoro não tardou a esquentar as tardes de sábado daquela varanda e o coração das vizinhas. Numa dessas tardes entre um lamber de línguas e outro, Odiléia pergunta a Aristeu: Você gosta de pescaria? E ele responde: Adoro!
É Odiléia, deu ruim.
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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.