A Eleição
SÃO GONÇALO DE AFETOS
Por Paulinho Freitas
Os ânimos andavam exaltados lá pelos lados da restinga. A sinopse do enredo já havia saído, os sambas quase prontos para irem a quadra para a mais esperada disputa de sambas de enredo de todos os tempos na nossa querida G.R.E.S. Poço do Anil. Tião Gavião estava animado, seu samba era excelente, além disso, ele tinha entrado de cabeça na Campanha de Ameriquinho, candidato a vereança e que tinha o apoio da escola.
Tião Gavião pintou seu carro nas cores azul e branco, cores da escola, fez o jingle de campanha do candidato e pagou ao intérprete oficial para gravar e colocou seu carro com enormes alto falantes no teto tocando o jingle dia e noite e passava todo o tempo que tinha de folga em seu trabalho de curtidor no Cortume do Rozendo, fazendo panfletagem por todo o bairro.
Osmar vociferava nos microfones da quadra que quem não votasse em Ameriquinho seria afastado da escola.
Na apresentação dos sambas, Tião Gavião era só alegria. Pagou bebidas, fez churrasco, distribuiu muitas camisas estampadas em silcscreem pelo multiartista Zé Olímpio e seu samba fez um salseiro danado na quadra. Os concorrentes também fizeram bonito, mas Tião Gavião era a imagem de um autêntico campeão.
A frustração foi que o presidente marcou a final de samba para depois das eleições.
O tempo passou, as eleições chegaram e Alcyr Coelho que sequer tinha seu nome citado nas rodas de conversas sobre política ganhou as eleições para vereador, deixando Ameriquinho possesso. Afinal tinha investido pesado na comunidade, distribuído cestas básicas, pago cervejas e feito churrasco pra todo mundo. Até a limpeza do rio que passa atrás da quadra da escola mandou limpar para as chuvas que viriam em janeiro não invadissem as casas da Travessa Leda.
Toda reunião de compositores, mandava o tira gosto e a bebida para inspirar os poetas. Para completar, na final de samba quem levou a melhor foi Élcio Beija-flor, eleitor de Alcyr Coelho, que por baixo dos panos conseguiu uma excelente subvenção para a escola, além de pôr uma graninha no bolso de Osmar para a reforma da quadra. Ameriquinho não se conformava com a derrota, mas a vida de político é assim mesmo. Um dia se está contra, outro dia é aliado e vida que segue.
Tião Gavião, após perder no concurso de Sambas de enredo, deu aquele “migué” dizendo que infartou. Na verdade, ele estava morrendo de medo da mulher, pois tinha posto o dinheiro das férias e do décimo terceiro nas despesas de eliminatória e na campanha eleitoral. A história não convenceu a mulher, que lhe aplicou uma surra no meio da quadra e o botou pra casa feito criança que fez arte: debaixo de vara. Tião jurou nunca mais pisar numa quadra de escola de samba.
Novamente vem o tempo, aparando arestas e apagando rusgas, mágoas e rancores e no período eleitoral seguinte, a filha de Osmar se tornou candidata. Tião Gavião foi visto, sentado na praça do Gradim, bebendo um traçado feito no bar de Bacucy e balbuciando o refrão do novo jingle que fará para a candidata. Seu samba para concorrer neste ano também já está pronto. A mulher dele já avisou que vai dar merda, os amigos o aconselharam a desistir, mas Tião está determinado: _ Esse ano é meu! Viva as mulheres!
Boa sorte Tião! Você vai precisar.
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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.
