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Foto do escritorJornal Daki

O prefeito que rouba livros, por Mário Lima Jr.



Iniciado em 2017, a pior marca do governo Nanci não é o nepotismo. Ou a submissão da liderança municipal aos tentáculos nervosos da primeira-dama e à voz grossa e oportunista do vice-prefeito. Muito menos o gosto por uma cerveja gelada na Praia das Pedrinhas, de vez em quando isso não faz mal algum. O maior crime de José Luiz Nanci como prefeito de São Gonçalo é promover a ignorância e a falta de cultura. Além de ser incapaz de colocar para funcionar o caro teatro erguido no Centro da cidade, Nanci escondeu mais de 20 mil livros e fechou a única biblioteca pública disponível para a população gonçalense, a segunda maior do Estado do Rio de Janeiro.

A biblioteca e o teatro são os aparelhos de divulgação de conhecimento e manifestação cultural e artística mais básicos de uma região. Locais onde pessoas se conhecem, interagem e colocam ideias em prática. São Gonçalo, com 1 milhão de habitantes, não tem nenhum dos dois.


Para o governo Nanci, o baixo número de visitantes minimiza o crime de ter encaixotado os livros e fechado a biblioteca. A conta de um gestor público deveria ser diferente. Para cada biblioteca fechada, no mínimo duas deveriam ser abertas antes. Programas de incentivo à leitura poderiam ser criados e assim o número de leitores aumentaria. Cidades mais destruídas que a nossa, vítimas da guerra, já passaram por esse processo através da inovação e parcerias com o setor privado.

Além disso, o funcionamento da biblioteca municipal dentro do Centro Cultural Joaquim Lavoura por 30 anos era um símbolo de resistência e esperança. Poucos espaços públicos do município contam com três elementos simples, que estimulam a criatividade: sombra, ventilação e silêncio. Embora sucateado e sem a programação cultural que a cidade merece, chegar no Lavourão, sentir a brisa, pegar um livro emprestado e se sentar para ler significava se afastar do abandono e da desordem urbana por alguns instantes.

Quem valoriza o poder dos livros não os esconde nem por um minuto. São Gonçalo já saiu perdendo, ainda que seja cumprida a promessa de inauguração de uma nova biblioteca na sede da Secretaria Municipal de Educação, na Rua Uriscina Vargas, entre o Alcântara e o Mutondo. O local é desagradável e distante do Centro. Há opções de transporte, mas a nova biblioteca não estaria tão integrada à vida gonçalense da mesma forma que o Lavourão, que tem lugar de destaque no município. Sem incentivos, o número de visitantes tende a cair.

Juntos, os dois últimos prefeitos de São Gonçalo, Aparecida Panisset e Neilton Mulim, roubaram milhões de reais da cidade. Panisset distribuiu para instituições religiosas. Mulim dividiu com os seus comparas e guardou uma parte dentro da churrasqueira. Ambos foram condenados e penalizados pela Justiça por seus crimes. José Luiz Nanci roubou algo mais valioso que dinheiro. Quase 60% dos gonçalenses com mais de 24 anos não terminaram o Ensino Médio, de acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Aqueles que não concluíram o Ensino Fundamental representam 38,3%. A leitura, as artes e a cultura são ferramentas de transformação social no mundo inteiro. A última ferramenta que São Gonçalo tinha à disposição foi encaixotada e deixada dentro de um galpão.


Mário Lima Jr. é escritor.


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