Os tempos são outros, por Fábio Rodrigo
Paro diante de uma árvore frondosa, que, com seus longos galhos, dão-me a merecida sombra a me livrar do sol escaldante. Espalhados pelo chão, vários frutos de coloração amarela nos pedem para serem degustados. Vejo que há inúmeros ainda por cair e que exalam um odor convidativo de fruta madura. Não, caro leitor. Eu não estou em um sítio ou chácara. Estou em uma das avenidas mais movimentadas do Rio de Janeiro: a avenida Rio Branco. A árvore a que eu refiro é um oitizeiro, que produz o oiti, esta frutinha adocicada e de cor atraente. O oitizeiro é uma árvore muito utilizada na arborização de cidades, como o Rio de Janeiro, que ajudaram no processo de transformação da cidade.
O Rio de Janeiro, no começo do século XX, viveu um período de reformas urbanísticas implementadas pelo prefeito Pereira Passos. Entre as construções da época estão o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional, o Museu Nacional de Belas Artes, além da Avenida Rio Branco, chamada na época de Avenida Central, e que hoje, por conta de outro projeto urbanístico realizado recentemente, já não permite que se trafeguem automóveis em toda sua extensão. Nela, percorre uma das linhas do VLT, veículo leve sobre trilhos.
Tirei o dia para observar tudo aquilo que, devido à correria do dia a dia, passa despercebido aos nossos olhos. Como se diz em francês, sou hoje um flâneur pelas ruas do Rio. Sem compromisso, observo atentamente o vaivém, o vai-volta, o corre-corre, o pega-pega... enfim, palavras compostas bem comuns que retratam o cotidiano das grandes cidades. Todos na rua fazem maquinalmente sua rotina diária. Parecem programados para realizar comandos. Não se importam com o pedinte sentado na calçada. Talvez nem tenham dado conta dos oitis à beira do caminho.
Os tempos são outros. Já não se têm cafés, livrarias e confeitarias a discutirem ideias abolicionistas ou republicanas. Mais adiante, a praça da Cinelândia já não é mais palco de manifestações por Diretas Já. O Teatro Municipal, que antes era alvo de críticas pelo alto custo de sua construção, hoje carrega a pompa de ser um berço artístico e cultural da cidade. Enfim, o cidadão carioca respira involuntariamente ares de contínuas transformações.
Na praça da Cinelândia, sento em um dos bancos bem defronte ao Teatro Municipal. Conforme falei anteriormente, estou hoje a observar. Apenas isto. Nem que seja a revoada de pombos à minha frente. Como em qualquer grande cidade, estes se proliferaram e podem transmitir doenças por meio de seus dejetos. Esse é o preço que se paga pelo progresso citadino. Agora mesmo quase fui alvo de um que sobrevoou por mim. Acho melhor levantar e continuar com minhas observações em outro momento para que não venha a ser atingido. Até mais. Fui.
Fábio Rodrigo G. da Costa é professor e mestre em Estudos Linguísticos.