Exterminar em legítima defesa, por Mário Lima Jr.
Para os eleitores da extrema direita, Jair Bolsonaro é um mito divino insuperável, enquanto Sergio Moro é o belo super-herói de queixo empinado, como circula nos memes das redes sociais. Juiz federal aos 24 anos e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, no dia 4 de fevereiro Moro mostrou suas intenções mais íntimas, na forma de um projeto de lei anticrime, a governadores, secretários estaduais de segurança pública e ao Brasil. O projeto possui iniciativas específicas que podem ser úteis, porém se transforma em política de extermínio quando trata de medidas relacionadas à legítima defesa.
O documento online que guarda o projeto de lei foi intitulado como “Memórias de Curitiba”. O ex-juiz claramente se vê em uma cruzada do Paraná ao Distrito Federal, trajetória onde já condenou cento e quarenta pessoas, entre políticos e empresários, a mais de dois mil anos de prisão. Como ministro, Moro exerce maior poder e influência e seu senso de responsabilidade perante a nação aumentou de forma perigosa.
A proposta mais discutida ao longo da semana diz que juízes poderão reduzir até a metade ou deixar de aplicar pena a agente policial, ou de segurança pública, que cometer excessos em legítima defesa decorrentes de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. O agente do Estado matará quando sentir que deve, ao invés de julgar racionalmente através de treinamento apropriado. Mais violenta é a mudança proposta para o Artigo 25 do Código Penal. Prevenir injusta e iminente agressão a direito, qualquer direito, diante de risco iminente de conflito armado seria considerado ato em legítima defesa. Os diversos bairros sob o domínio do tráfico de drogas, miseráveis e negros na sua maioria, estão em risco constante de conflito armado. Movidos pela emoção, de olhos fechados de medo, os agentes do Estado terão amparo completo da lei para atirar e matar.
É a limpeza social e racial tão sonhada pelo confuso cidadão de bem, implementada pelo herói da nação. Um presente para o grande lado violento e corrupto da nossa força policial. Inimigo da sociedade, mas não do governo Bolsonaro e dos gabinetes legislativos da família do presidente, homem que apenas tolera a democracia.
Esse não é um governo preocupado com o desenvolvimento de valores culturais e humanos de empatia e solidariedade. É um governo dedicado às armas de fogo e à morte. A pátria não é amada como diz o slogan, precisamos de mais inteligência e menos ódio para tratar o fosso de pobreza e racismo que nos afasta.
No final do projeto, revelando sua identidade heroica hollywoodiana, Moro tascou um termo em inglês: whistleblower. Não temos na língua portuguesa um adjetivo com um sentido tão amigável, algo como “informante do bem”. Também não temos em Português um termo que defina e explique Sergio Moro. Escravo obediente da missão de livrar o Brasil do crime, ainda que influencie os rumos da democracia. Ministro por dever, não por satisfação ou glória, mesmo que o Estado brasileiro se torne mais assassino.
Mário Lima Jr. é escritor.