Esforço para entender o racismo, por Mário Lima Jr.
Eu andava com meu filho na rua quando passou por nós um rapaz negro, sem capacete e sem camisa, pilotando uma moto em alta velocidade. Cena comum em São Gonçalo, a moto não tinha placa e a lanterna havia sido arrancada. Meu filho, com 6 anos de idade, me perguntou meio assustado: “Pai, por que todo bandido é preto?”. Eu lembrei do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, e disse ao meu filho o óbvio, nem todo bandido é negro. Mas não fiquei satisfeito com minha resposta, ela não estava à altura da complexidade da pergunta. Um racismo secular prejudica os negros do Brasil e cria, desde cedo, uma sociedade preconceituosa e hipócrita.
Segundo uma pesquisa do Instituto Data Popular, divulgada em 2014, 92% dos brasileiros acreditam que existe racismo no país, no entanto, apenas 1,3% admitem ser racistas. Um levantamento do Ibope, realizado em 2017, aponta discrepância semelhante: só dois em cada dez brasileiros assumem ser preconceituosos, enquanto 73% dos entrevistados afirmaram ter feito comentários considerados racistas, machistas ou homofóbicos alguma vez na vida. A conta não fecha, o brasileiro não conhece a si mesmo ou prefere não dizer a verdade sobre o que sente.
Eu tenho medo quando se aproxima de mim qualquer adolescente negro mal vestido. Penso que vou ser assaltado. Eles circulam descalços, com o olhar perdido, na Barra da Tijuca, bairro nobre carioca onde o presidente Bolsonaro montou a base da sua campanha eleitoral. Geralmente a intenção deles é vender um doce e levar para casa uns trocados. Alguns atacam os pedestres, infelizmente, mas a questão é que têm a mesma origem o meu racismo e o fato de aproximadamente 64% da população carcerária brasileira serem pretos e pardos.
Darcy Ribeiro estimou em seis milhões o número de negros introduzidos no Brasil até 1850. Seres humanos “gastos” até a morte em trabalhos forçados durante a escravidão, que durou trezentos anos. O país não saiu desse massacre de cabeça erguida, vítimas nem carrascos. A chance atual de um jovem negro ser assassinado é quase três vezes maior do que a de um jovem branco.
Em 2016, negros ocupavam somente 4,6% dos quadros executivos das empresas, segundo pesquisa do Instituto Ethos, em parte porque a pele negra não faz parte da imagem do candidato ideal inserida na cabeça do recrutador. Muitos acreditam que basta ter qualificação profissional para superar a desigualdade e vencer na vida, mas o Brasil não é tão simples. Entre pessoas com formação superior, brancos ganham por mês 47% mais do que negros.
Quando não se manifesta de forma voluntária, o racismo influência nossas decisões através daquilo que a ciência chama de viés inconsciente. Podemos permanecer atentos a esse fenômeno natural do cérebro humano desde que as sequelas do crime da escravidão sejam combatidas por cada cidadão. Espero superar o racismo e ajudar meu filho a entender a sociedade em que vive à medida que adquire maturidade. De acordo com as estatísticas, os brasileiros chegam à idade adulta e continuam incapazes.
Mário LIma Jr. é escritor.