Dedique seu voto à democracia, por Mário Lima Jr.
Em abril de 2016, Jair Bolsonaro dedicou seu voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff à memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, único militar reconhecido pela Justiça como torturador durante a ditadura. A declaração significa que Bolsonaro “quer que o Estado continue a torturar e exterminar pessoas que pensem diferente dele”, nas palavras de Maria Amélia Teles, uma das vítimas do coronel Ustra. No segundo turno das eleições presidencias o eleitor decidirá que Estado quer construir, democrático ou admirador da tortura.
A afirmação de Maria Amélia é coerente. Mês passado, o candidato do Partido Social Liberal (PSL) subiu em um trio elétrico, segurou o tripé de uma câmera como se fosse uma arma e disse ao microfone: “Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre!”. A assessoria de campanha de Bolsonaro alegou que o gesto foi uma brincadeira. Um candidato à Presidência que brinca dizendo que vai fuzilar opositores políticos revela no mínimo desprezo pela democracia e imaturidade incompatível com a República.
Depois de espancar Maria Amélia, o homem que Bolsonaro homenageou, ex-chefe do DOI-Codi paulista, trouxe os filhos dela, de 5 e 4 anos de idade, e os colocou na frente da mãe. Maria Amélia estava machucada, vomitada e nua, sentada na cadeira do dragão, instrumento usado para aplicar choques elétricos nos torturados. Hoje adultos, os filhos de Maria Amélia ainda carregam as lembranças e o trauma.
Durante seu voto no plenário da Câmara, em 2016, Bolsonaro descreveu Ustra como o pavor de Dilma Rousseff. Também torturada nos porões da ditadura, a ex-presidente revelou em entrevista que foi ameaçada de morte pelo coronel na década de 70. Bolsonaro demonstra, publicamente, orgulho desprezível pelos crimes de Ustra. E não é o único. O general Hamilton Mourão, candidato à vice-presidência, é outro notório fã do falecido coronel, acusado pelo desaparecimento e morte de pelo menos 60 pessoas.
A chapa do PSL não apresenta uma proposta ideológica razoável, o que vemos é intolerância e racismo. Na opinião de Mourão, heróis matam, o branqueamento da pele está associado à beleza de uma criança e as Forças Armadas podem tomar o poder se julgarem necessário. Bolsonaro, por sua vez, já declarou que no Brasil nada se resolve através da democracia, mas fechando o Congresso e matando 30 mil pessoas. Ele nega aos índios e quilombolas o direito às suas terras ancestrais e o único aspecto que pôde notar ao visitar um quilombo, espaço de preservação da história e da cultura negra, foi o peso corporal dos quilombolas.
Assassinato é crime. Tortura também. E não existe hipótese em que sejam aceitáveis. A democracia não exige apenas respeito à diversidade política, mas à dignidade humana, principalmente quando ameaçada por declarações perigosas de candidatos à Presidência. Tão desejado por aqui, o retorno do desenvolvimento econômico depende de uma sociedade escolarizada e guiada por sua consciência, algo bem diferente do que militares do Exército, ensinados a cumprir ordens ao invés de pensar, são capazes de propor.